Quanto vale hoje um(a) professor (a)?

 Clipping 02-05-11
WALKER, Maristela Rosso. (Professora, pedagoga, doutoranda em Educação pela UEM/PR) e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. - O que me motiva a colocar a “boca no trombone” e expressar minha indignação com relação ao que vem ocorrendo com a profissão docente em nosso país, advém de uma trajetória de mais de 30 anos dedicados à educação, atuando em todos os níveis de ensino, tanto na esfera privada como a maior parte e até hoje na esfera pública.

Atuei como professora de 1ª a 4ª série por 13 anos. Passei pela experiência de 5ª a 8ª séries em escola de zona rural. Lecionei para cursos de Magistério em nível Médio, de Formação de Docentes das Séries Iniciais e Finais, em especializações ligadas a área de Educação e formação de professores. Orgulho-me que em minha carreira formei muitos professores e professoras, bem como tantos outros profissionais.

Atualmente sou professora de Didática e Prática de Ensino, Profissão Docente: Identidade, Carreira e Desenvolvimento Profissional Profissão entre outras, atuando nos cursos de Pedagogia, Letras, Biologia, Formação de Professores (todos de licenciatura, em nível superior), na Universidade Federal do Acre- Campus Floresta em Cruzeiro do Sul, no Acre, desde 2005. Creio que isto me credencia a levantar uma bandeira de luta e de retomada da dignidade desta profissão. Faço esse retrospecto pessoal para reafirmar que não falo ou escrevo estando do lado de fora da profissão, nem ao lado. Insiro-me nela, luto por ela e permaneço nela, pois acredito como Paulo Freire que “a luta dos professores em defesa de seus direitos e de sua dignidade deve ser entendida como um momento importante de sua prática docente, enquanto prática ética. Não é algo que vem de fora da atividade docente, mas algo que dela faz parte.” (FREIRE, 2002, p. 27)
 
A Lei que foi sancionada em 16 de julho de 2008 sob numero 11.738 instituiu o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica, regulamentando disposição constitucional (alínea ‘e’ do inciso III do caput do artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias). A partir de 01 de janeiro de 2010 o Piso Salarial Profissional Nacional é de R$1.024,67 e corresponde a jornada de trabalho de 40 horas semanais. Não alcança dois salários mínimos vigentes em nosso país. Ao nos depararmos com o piso salarial das demais categorias profissionais, sem desmerecer ninguém, salta aos olhos o pouco valor atribuído a essa profissão, se a compararmos com os dentistas, médicos, engenheiros e tantos outros.
 
Após algum tempo afastada da região sul do país, me deparo com um edital de concurso público, na minha cidade natal, em que a um/uma professor/professora é ofertado o valor de pasmem, R$ 518,40 exigindo como formação Habilitação de Magistério em ensino médio ou curso de habilitação equivalente reconhecido oficialmente (curso normal superior e/ou pedagogia em séries iniciais). É R$ 12,13 que separam o valor correspondente ao Piso Salarial Profissional Nacional, se dobrarmos a jornada de trabalho.  Não chega sequer ao valor do salário mínimo vigente no país! Mas o que me indigna é o fato de saber que para ser professor/professora é necessário um bom investimento de tempo, de dinheiro, de estudos, realizado muitas vezes com grande esforço para alcançar um título, ter uma profissão. Tudo isso além do grau de responsabilidade que é atribuído à docência. Por incrível que pareça, pelas mãos dos professores/professoras passaram e passam todas as outras profissões. Será que só isso não a credencia a ser mais bem valorizada?
 
Ainda vale a pena ser professor/professora? Mesmo para quem gosta muito da profissão (como é o meu caso), vai sendo cada vez mais difícil conseguir encontrar argumentos positivos para colocar no prato "sim" da balança em contraponto aos sucessivos e rudes golpes que a profissão tem vindo a sofrer e que a fazem inclinar para o prato do "não". Por mim, ainda consigo incliná-la para o "sim", mas... por quanto tempo?
 
Os baixos salários e as más condições de trabalho contribuem para a fuga de estudantes das licenciaturas brasileiras. Em 2005, 77 mil pessoas pegaram o diploma para dar aulas no ensino fundamental e médio. Em 2009, o número caiu para 64 mil. Os dados são do último Censo de Ensino Superior do Ministério da Educação (MEC). Diante destes números, dos argumentos aqui apontados, por quanto tempo nós formadores de professores convenceremos jovens estudantes a ingressar na carreira docente? Com que motivação/argumentos solicitaremos a eles/elas as inúmeras leituras e práticas que são necessárias à sua formação? Quem conduzirá a educação deste país diante de tanto desvalor?
 
O que me deixa perplexa e me faz conclamar os educadores e educadoras deste país a “acordar” da letargia que nos cerca é que ano após ano, elegemos políticos que discursam e se elegem com a insígnia da valorização da educação. Que valorização é essa que nivela por baixo? Um país com políticos sérios não permitiria que os formadores de gente, aqueles que lapidam mentes humanas, precisassem mendigar condições de sobrevida e de trabalho. Nenhuma profissão usa sucata como laboratório de trabalho: ao professor são solicitados criatividade e desempenho a partir do que os outros descartaram, usando-a como instrumento de ensino e aprendizagem.
 
Acredito que é chegada a hora de dar maior destaque aos professores e professoras deste país. Os últimos governos acabaram com os sindicatos que se mobilizavam na luta por melhores salários e condições de trabalho. Mas não podemos cruzar os braços e simplesmente abandonar o barco. É preciso dar visibilidade a este profissional que tem a difícil tarefa de ensinar, de formar, de dar corporeificação as palavras pelo exemplo, pois como escreve Paulo Freire “Quem pensa certo está cansado de saber que as palavras a que falta a corporeidade do exemplo pouco ou quase nada valem. Pensar certo é fazer certo”. (FREIRE, 2002, p. 16) Só assim, penso que daremos um passo em direção ao resgate do trabalho docente, pois como Nóvoa (2009, p.4) afirma:
 
Os professores reaparecem, neste início do século XXI, como elementos insubstituíveis não só na promoção das aprendizagens, mas também na construção de processos de inclusão que respondam aos desafios da diversidade e no desenvolvimento de métodos apropriados de utilização das novas tecnologias.
 
Se a ele/ela são destinadas tantas responsabilidades, par e passo são necessários também valorizá-lo, dar-lhe condições dignas de trabalho, torná-lo visível perante a sociedade. Não falam os professores e as professoras. Eles/elas se calaram. Muitos desistiram, outros não querem mais abraçar essa profissão. Há uma ausência dos professores, uma espécie de silêncio de uma profissão que perdeu visibilidade no espaço público. Por isso, creio ser o momento de pensar e agir criticamente em prol desta profissão, antes que ela seja tomada por aqueles que querem fazer dela um simples “bico”. Concluo afirmando que é na competência que se organiza politicamente onde talvez esteja à maior força dos educadores. É preciso voltar a lutar, mas reconhecendo-se que a “a luta é uma categoria histórica, reinventar a forma também histórica de lutar.” (FREIRE, 2002, P.27)

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REFERÊNCIAS
 
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25. Ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
 
NÓVOA, António. Professores: Imagens do futuro presente. Lisboa: EDUCA, 2009.
 

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