Comentários no mundo digital: a instantaneidade, os robôs de software e o ódio
Professora Tania Tait escreve artigo sobre o uso dos meios de comunicação e o efeito dos “comentários” no mundo digital.
Imagem/reprodução Internet
Por Tania Tait
A participação da população sempre ocorreu nos meios de comunicação, seja no jornal impresso, rádio ou televisão. O envio de cartas aos meios de comunicação e a participação nos programas de rádio fazem parte da tradição do relacionamento destes meios com a população.
O relacionamento, no entanto, sempre foi monitorado e comandado pelo gerenciamento do meio de comunicação que possui o controle sobre as mensagens recebidas para divulga-las ou não.
Esse mecanismo chega ao jornalismo web e as redes sociais digitais da mesma forma. Tanto os meios de comunicação como os produtores de conteúdo individuais nas redes digitais podem excluir ou manter comentários. Muitas vezes, pela rapidez da comunicação, não dá tempo de excluir comentários abusivos antes que alguém os tenha lido.
Além dos meios de comunicação oficiais, o mundo virtual nos traz a figura do/a produtor/a de conteúdo, ou seja, aquela pessoa que escreve suas observações ou ideias e posta na rede social digital de sua preferência. Essa produção de conteúdo também se sujeita aos comentários que podem ser realizados.
Assim, no mundo digital são expoentes três tipos de situações inéditas que eram tímidas nas antigas formas da participação popular nos meios de comunicação: a instantaneidade, o uso de robôs de software e o destilamento de ódio pelo ódio. Essas três situações surgem, também, nas postagens da produção de conteúdo individual nas redes digitais.
A instantaneidade propicia que os comentários sejam realizados no momento que a notícia ou a postagem individual seja veiculada. As pessoas em seus comentários não se incomodam se estão ofendendo ou depreciando alguém nem a forma como estão escrevendo. Essas pessoas se sentem empoderadas pelo mundo digital pela oportunidade de estarem presentes e terem voz no momento exato da publicação, como se ela fizesse parte daquele processo de comunicação. E, realmente, ela faz parte daquele processo de comunicação, como integrante da relação emissor, mensagem e receptor.
O segundo elemento são os robôs de software, nome dado aos perfis falsos que reproduzem informações, as vezes compartilhadas até com erros de escrita ou trocas de letras. O que se vê nesses robôs é a mesma forma de reprodução das informações, sem reflexão, sem conteúdo. Os robôs apenas colocam afirmações ou criticas de forma limitada mas, de fácil compreensão para quem reproduz ou lê. Não é à toa que nas redes sociais criou-se a expressão “textão” de forma pejorativa referindo-se a textos maiores e que trazem alguma reflexão. A negação do texto mais completo que leva a reflexão faz parte de uma estratégia de emburrecimento e de massificação de ideias que sustentem a versão oficial, seja do meio de comunicação, da plataforma digital ou de governos.
O ódio pelo ódio, como parte da terceira situação encontrada nas redes digitais torna-se, também, uma estratégia para a não reflexão sobre a situação em que se está noticiando ou comentando. No destilamento do ódio, as pessoas exalam o que tem de mais ruim em seu interior, sem pudor algum. Ao olhar mais a fundo, percebe-se que esse ódio também faz parte de uma estratégia de poder na qual não se pode analisar determinada situação sem relacionar com fatos ou personalidades que nada tem a ver com aquela situação. O ódio, portanto, serve para distrair as pessoas dos fatos reais.
Muitas pessoas não gostam de ler os comentários pois se sentem mal. No entanto, os comentários nos fazem conhecer a realidade, seja feito por robô ou seres humanos, a verdade da perversidade humana se desvenda aos nossos olhos. Mesmo porque, por trás de um robô de software existe um ser humano que faz parte de um projeto de poder para exalar o ódio e “cegar” as pessoas para uma avaliação mais concreta dos fatos.
Ao expor suas ideias nas redes sociais, a pessoa está exposta também a uma série de comentários que são desanimadores e, realmente, esse é o intuito: minar as pessoas que pensam de forma diferente.
No caso dos meios de comunicação, a postagens de notícias também geram comentários ofensivos. Os comentários ofendem o meio de comunicação de todas as formas possíveis, no entanto, indaga-se se essas pessoas são mesmo leitoras ou será que agrupamentos fazem combinação para atacar? Eis aí mais um ponto a ser tratado sobre as redes sociais digitais.
Certamente, cientistas das áreas de humanas estão se debruçando sobre as redes sociais digitais e sua influência em nossa sociedade para medir o alcance da instantaneidade, dos robôs de software e do destilamento do ódio, entre outros elementos que marcam as redes.
Cabe a nós, entretanto, conhecer bem as tecnologias fazendo uso delas da melhor forma possível, com a garantia da liberdade de expressão combinada com o respeito às diferenças, em todos os campos de atuação.
Tania Tait é professora aposentada da UEM, foi presidente do Conselho Municipal da Mulher de Maringá, integrante da Ong Maria do Ingá Direitos da Mulher e do Forum Maringaense de Mulheres. Autora do livro: As mulheres na luta política, lançado em 2020.